sexta-feira, 25 de novembro de 2022

O incrível normal

Eu não quero banalizar coisas incríveis.

Eu não sei você...

Mas eu não quero dizer que tanto faz.

Não quero falar: "Ah, normal... As pessoas são incríveis e existem coisas incríveis acontecendo a todo momento em todo lugar..." Porque não é bem assim.

Contando dos meus processos com um amigo, falei das minhas dores em relação à crença de que não sou amada, da lista que fiz das pessoas que me amam... Do quanto ando mais atenta às movimentações de carinho, às ações de amor que cada relação me traz... E contei também que reli a sua mensagem sobre a aula de dança que você me propôs e que só hoje tomei atenção à parte em que dizia: "isso é o melhor de mim que eu tenho a oferecer". Aquilo não era apenas uma aula de dança. E nem só um presente... Aquilo era uma puta demonstração de amor!

E eu demorei pra perceber. Mas percebi.

Eu segui a conversa, mas por um segundo meu amigo me interrompeu: "Calma! Eu preciso te dizer que isso é muito foda. Que incrível você ter entrado em contato com essas coisas e ter se dado conta de tudo isso... E nem foi depois de uma sessão de terapia! Você mesma olhou e validou essas demonstrações de amor, você percebeu sozinha os afetos que te permeiam... E você conseguiu ver tudo isso no meio da dor. Não foram meses depois, foi agora: você afundada em dor e luto conseguiu olhar pra tudo isso. Isso é muito foda!"

E sabe, ele tá certo: Isso é muito foda mesmo!

Aí lembrei que compartilhei vários desses meus processos com você naquela conversa na praça, assim como você também me compartilhou coisas muito fodas. Você tem uma série de reflexões, insights, questionamentos e posturas que me deixam sempre alegremente surpresa! É bonito te ouvir.

E eu acho que nunca te disse isso. Porque me acostumei.

Acostumei a me relacionar com alguém que questiona, que se escuta, se observa e está disponível a mudar.

Aliás, acho que pessoas com essas qualidades são extremamente apaixonantes!

Talvez por isso a gente tenha se apaixonado.

E aí percebi o quanto a nossa relação estava cheia disso... De conversas incríveis, de processos intensos de olhar pra si e de mais conversas incríveis sobre todos esses processos.

A gente nem se surpreende mais tanto quando escuta o outro falar sobre algo muito profundo e bonito que acessou.

O fim da nossa relação em meio a tantas qualidades, me fez pensar que talvez a gente (ou você) tenha banalizado as coisas incríveis. Como se elas não fossem tão incríveis assim ou como se pessoas incríveis e relações incríveis fossem encontradas a cada esquina...

Não são.


Você é incrível.

Eu também.

Nossa relação foi incrível.

E por mais que por alguns momentos eu não tenha dado valor à isso, hoje eu percebo a importância de não normalizar.

Às vezes me pego pensando: Se com tudo o que tínhamos essa relação perdeu o sentido, será que não é por que deixamos de enxergar e valorizar todas as qualidades que o outro tem e tudo que essa relação nos agregava?

Eu não sei.

Não sei o que se passa aí.

Não sei os seus motivos.

Não sei por que acabou.

Eu só sei que nas próximas relações eu irei tomar muito cuidado, porque...

Eu não quero banalizar coisas incríveis.

Uma relação de potências

Hoje numa mesa de bar conversando com um amigo sobre relações, não monogamia, romances antigos (e atuais) volto pra casa com as mesmas perguntas de sempre, ainda mais fortes:

Como você não percebe o valor do nosso diálogo?

Como você não vê como difícil é se relacionar com pessoas que pensam pra além do formato monogâmico padrão encaixotado?

Talvez você nunca tenha parado pra pensar em como somos livres pra nos relacionar com outras pessoas quando estamos juntos...

E como, quando isso é incômodo, a gente resolve de maneira madura em algumas conversas.

Pode ser que você nunca tenha notado o quanto vamos fundo nas nossas questões e nos nossos questionamentos.

Talvez você nunca tenha percebido como a gente se coloca disponível pra se escutar, se rever e mudar de postura…

Isso é raro.

Lembro da Priscila perguntar, ao me ver falar sorrindo sobre nós dois: “o que você sente que encontrou nele?”

E eu disse: “um lar”

Talvez por isso me doa tanto.

Parte de mim está sem teto.

Parte de mim perdeu o lar.

Parte de mim não sabe pra onde ir.

Porque parte de mim acredita que já viu e viveu o bastante pra entender a preciosidade do nosso encontro.

Quando me parece que você não consegue ver isso também, eu não consigo sentir nada além de dor.

Hoje ouvindo meu amigo falar sobre a menina que ele tá se relacionando, onde eles não conseguem conversar sobre assuntos mais densos e entrar em diálogos vulneráveis, eu pensei:

“Que loucura! Eu nunca viveria uma relação assim!”

Ao mesmo tempo o que meu amigo me relatou é o que a maioria das pessoas que eu conheço relata:

A inexistência de diálogos, a ausência de escuta, a falta de liberdade e autonomia, a não responsabilidade, a escassez de amor...

Isso é fácil de encontrar. Se acha em qualquer esquina. As relações por aí estão cheias disso.

O lugar onde a gente se relaciona é pra poucos, meu bem. E você sabe disso. Assim como sabe que não somos qualquer um. Você mesmo já disse!

Pessoas potentes se atraem e são atraídas por pessoas potentes.

Mas se pra você nossa relação é rompida ou questionada por tão pouco e apesar de tudo isso…

É porque por algum motivo o nosso jeito de enxergar as nossas potências é estranhamente diferente.

sábado, 19 de novembro de 2022

Saudade dói

Às vezes vejo você na minha mesa de café da manhã, que ainda segue com duas toalhas do jogo americano.

Também penso em você na minha cama. Sobra espaço demais quando cê não tá.

Às vezes te vejo dançando na minha sala. E fico admirando.

Te vejo fazendo café preto na cozinha. E colocando o seu por engano no meu pote. Aliás, seu café tá lá ainda.

Às vezes te vejo no chão da sala fechando um baseado enquanto tocam aquelas nossas músicas aleatórias na minha TV.

Acordo lembrando da nossa conchinha.

E fico pensando que queria te dar bom dia com cafuné no cabelo.

Te escuto cantando enquanto toma banho.

Imagino seu rosto na minha frente e logo vem a minha vontade doida de te encher de beijo.

Eu ainda faço panqueca a mais pra nós dois.

Também lembro das nossas conversas, da gente rindo junto.

E depois debatendo todas as questões existenciais da vida em papos que poderiam nunca acabar.

Lembro do seu rosto colado no meu, da respiração lenta e o beijo demorado.

Você tá aqui.

Em muitos lugares pela casa.

Em muitos lugares dentro de mim.

Eu sinto sua falta e fico perguntando como você não sente a nossa.

Como não faz tapioca de banana pensando que eu poderia estar aí tomando o café preto que eu nem gosto?

Como fica na sua sala sem nunca lembrar da gente brincando de dançar?

Esses dias passei pelo restaurante do nosso primeiro encontro, aqui na Barra.

Lembra?

Pensei em você.

Sorri de canto pensando como nosso começo foi bom.

Agora sinto saudades de quando aquele restaurante era só um restaurante.

De quando andar pela Lapa não me lembrava você.

E de quando várias músicas não me faziam chorar.

O problema da saudade são as memórias.

Porque elas veem sem pedir licença.

Lembrando tudo de bom que existiu ali.


Queria não lembrar...

Queria ter memória curta igual você.

Pra não sentir falta

da falta que você faz.

Coisas que aprendi com você

Eu queria que você soubesse que tenho mergulhado cada vez mais fundo nos meus buracos e feridas familiares sobre falta de amor, ausência de carinho e necessidade de validação - e o quanto isso afeta e repercute nas minhas relações.

Queria que você soubesse que a dança passou à ocupar um lugar muito mais importante na minha vida. Que a relação com o corpo e o outro através da dança tem me tocado cada vez mais. E que hoje eu penso inclusive na possibilidade de trabalhar com dança.

Eu queria que você soubesse que tenho observado mais o outro, o espaço e os momentos. E que tenho confrontado diariamente as minhas ideias sobre amor e os meus ideais românticos.

Eu queria que você soubesse que ando na rua prestando atenção no alinhamento da minha coluna, no encaixe do meu quadril. E que minhas dores na lombar diminuíram.

Queria que você soubesse que às vezes ponho Gilberto Gil pra tocar. E fico prestando atenção nas letras.

Também queria que você soubesse que adorei conhecer Cabo Frio. Que voltei a dançar samba. E que tenho usado limão como desodorante. E minhas amigas riem disso.

Eu queria que você soubesse que hoje sou mais atenta à minha fala, ao meu excesso de fala. Principalmente se estou numa roda com pessoas pretas.

Queria que você soubesse que voltei a escrever. Que me reconectei com o diálogo do coração e o desabafo da caneta.

Eu queria que você soubesse que voltei a pensar em procurar minha mãe, fazer as pazes e reconstruir essa relação.

Queria que você soubesse que hoje dissemino por aí a origem do termo "samba de gafieira" e tantos outros diálogos acerca de dança, arte e os recortes raciais.

Que passei a ver mais importância no debate político e em massagens na bunda.

E que tenho me aprofundado mais e procurado formas de inserir no meu trabalho a discussão sobre cidadania, revisionismo histórico e se pensar o Brasil.

Queria que você soubesse que essa é uma pequena lista das coisas que aprendi com você. Das muitas coisas que aprendi com você. E que sou extremamente grata a cada uma delas.

Brené Brown diz no especial dela que "Amar é ser vulnerável. Amar é dar seu coração à alguém e dizer: sei que posso me magoar, mas eu quero fazer isso."

Então, por fim, queria que você soubesse que eu te amei. E muito.

Doída

Do.í.da.

Doida.

Dói ser doida quando se está doída.

Dói a dor de não ser escutada

De não ter a dor ouvida

Saber que dói aqui e não dói aí

Me deixa ainda mais doída.

Ou doida.

Tudo depende pra quem dói

Ou pra quem nada dói


Pedir amor dói

Pedir amor e não receber dói mais

Pedir amor, não receber e ainda se sentir mal por pedir amor é muito doído.


Como pedir amor pode ser tão ofensivo?

Será que estamos todos doidos?

Ou será que estamos todos doídos?